Plano Funeral e o estado de calamidade pública

Após ser decretado no Brasil o estado de calamidade pública em decorrência da pandemia mundial ocasionada pelo COVID-19, várias dúvidas de empresários do setor funerário surgiram, dentre elas, dúvidas em relação aos planos de assistência funerária.

Os questionamentos e dúvidas são comuns, uma vez que essa situação não é corriqueira, mas que foge do nosso dia a dia e não se trata de uma situação local, mas de proporções mundiais, que afeta uma série de cadeias produtivas, de serviços e de consumo.

Em relação aos planos de assistência funerária, há dúvidas sobre o desenvolvimento da atividade e a forma de atendimento dos clientes, em especial à forma de prestação dos serviços e observância às cláusulas contratuais.

Antes, temos que analisar algumas situações, principalmente as legislações federais, estaduais e municipais aplicáveis a cada situação:

  • A empresa de plano de assistência funerária pode continuar trabalhando normalmente após a decretação do estado de calamidade pública?

Tendo em vista que a atividade de assistência funerária se trata de uma atividade distinta da prestação de serviços funerários, não é considerada então,  uma atividade essencial, devendo, em relação ao funcionamento dos estabelecimentos e atendimento ao público, atender as previsões das demais legislações locais pertinentes ao funcionamento de estabelecimentos durante o período de calamidade pública, não devendo tal atividade seguir as mesmas regras destinadas aos serviços essenciais.

É necessário levar em conta, nesse caso, as diferentes legislações locais, em que, em algumas situações estabelecem restrições ao funcionamento e em outras não apresentam restrição alguma. O Brasil possui uma grande extensão territorial, com diversas realidades regionais que devem ser observadas analisando as determinações federais e dos governos locais.

Várias empresas funerárias, cuja atividade é essencial, exercem também a atividade de administração de planos de assistência funerária. Nas situações em que ambas as atividades são exercidas em conjunto e existe vedação da legislação local quanto ao funcionamento, e ou estabelecendo limites de horários de atendimento, assim como de quantidade de pessoas dentro do recinto, a empresa poderá continuar o atendimento da atividade essencial, não sendo legalmente permitida a continuidade de outra atividade fora dos limites estabelecidos pela norma local, devendo ser levado em conta também a responsabilidade social da empresa que deve zelar pela segurança à saúde de todos os frequentadores do estabelecimento (funcionários, colaboradores, clientes e sócios), que poderão ser submetidos, desnecessariamente a uma situação de risco em decorrência da possibilidade de contaminação não apenas pelo corona vírus, mas também por uma série de outras males que podem levar as pessoas a precisarem de cuidados médicos junto a hospitais e postos de atendimento.

Já para as empresas que possuem apenas a atividade de assistência funerária, não exercendo a atividade funerária (situações em que o serviço funerário é prestado por empresas autorizadas, nos termos do art. 2º da Lei Federal nº 13.261/2016), vale a mesma regra, sendo que estas empresas deverão obedecer as regras locais quanto a vedação ou restrições ao atendimento, funcionamento e ou horários e demais regras legalmente estabelecidas para as atividades não essenciais.

  • Mesmo a administradora de plano de assistência funerária não realizando o atendimento ao público, é possível continuar recebendo as mensalidades? E para os casos em que o cliente paga diretamente na empresa, sem boleto bancário?

Restrição do atendimento ao público e restrição das atividades da empresa são duas situações totalmente distintas. No caso das empresas que possuem as duas atividades, a de prestação de serviço funerário e a de administração de plano de assistência funerária, elas consequentemente continuarão atendendo os óbitos dos clientes do plano que vierem a ocorrer nesse período, sendo que, nesse caso, inexistirá suspensão da atividade, ocorrendo somente a suspensão do atendimento interno ao público. Nessa situação inexiste qualquer necessidade que justifique a suspensão das cobranças das mensalidades decorrentes dos contratos já firmados, pois os serviços objeto do contrato de assistência funerária será devidamente prestado pela própria empresa, em decorrência de sua atividade funerária, que é essencial e não será paralisada.

No caso de empresas cujos clientes não pagam através de boleto bancário, mas diretamente no balcão, é necessário de acordo com algumas legislações estaduais e municipais, verificar a possibilidade daquele atendimento. Como dito anteriormente, em caso de existir vedação legal local para o atendimento ao público, com suspensão da atividade ou restrição de horários de atendimentos e de quantidade de público que poderá frequentar internamente o estabelecimento, é necessário a adequação a tais normas, sendo que, caso o atendimento seja vedado, a empresa poderá encontrar outras alternativas para o recebimento, respeitando as normas de segurança e saúde a que todos estão submetidos nesse período (depósito em conta corrente ou transferência, por exemplo), lembrando que o consumidor jamais poderá ser prejudicado por situações particulares ou a deficiência da empresa, mesmo que seja em decorrência do atual estado de calamidade pública.

  • É possível ou permitido a administradora de planos de assistência funerária continuar comercializando contratos durante o estado de calamidade pública?

Inexiste qualquer vedação legal à continuidade da comercialização dos planos de assistência funerária, sendo que tais vendas devem observar estritamente as determinações legais e os protocolos de segurança e saúde já estabelecidos e os que vierem ser estabelecidos até o fim do estado de calamidade pública.

Para as empresas que trabalham com o sistema de venda porta a porta, é necessário observar as regras de segurança à saúde, assim como o respeito às pessoas que estão em isolamento social, que até o presente momento é indicado a todos (mas não obrigatório), inclusive aos proprietários e funcionários destas empresas, não sendo adequado a manutenção de tais vendas sem a observação das regras de segurança à saúde estabelecidas.

Em relação às demais modalidades de vendas, estas, desde que respeitadas as normas legais, podem ser normalmente desenvolvidas. 

  • Nos contratos que possuem cláusula que em caso de CALAMIDADE PÚBLICA eximem a empresa da prestação dos serviços de assistência funerária, a empresa de planos de assistência funerária pode suspender os atendimentos aos óbitos do plano a partir de quando foi decretada tal situação?

De acordo com o inciso V, do art. 8º da Lei Federal nº 13.261/2016 o contrato de plano de assistência funerária deve conter obrigatoriamente cláusulas que estabeleçam as formas de suspensão e ou cancelamento do contrato. Através desse entendimento, é possível estabelecer como causa de suspensão do contrato, situações decorrentes de calamidade pública, por exemplo. Para invocar essa cláusula a empresa necessita estar totalmente desprovida de condições de realizar o atendimento a seus contratos. Essa cláusula não dá o direito à empresa de, em caso de decretação de estado de calamidade pública, se negar a realizar atendimentos. Esta cláusula da a empresa, em caso de calamidade pública, quando a empresa não tiver mais condições de honrar seus contratos, o direito de invocá-la, visando amenizar seus prejuízos junto a seus clientes que vierem necessitar de seus serviços.

É importante lembrar que, caso a empresa durante o período de calamidade pública estiver comercializando contratos e decidir, por qualquer impossibilidade acionar a cláusula em questão, suspendendo seus atendimentos, ela deve imediatamente suspender também suas vendas, pois caso continue estará ofertando algo que não pode fornecer e poderá ser considerado uma oferta ilegal de serviços, infringindo assim o contido no art. 6, IV do Código de proteção e Defesa ao Consumidor, que prevê que são direitos básicos do consumidor a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços, sendo que tal prática pode sujeitar os responsáveis pela empresa à penalidade contida no art. 67 do CDC, que seria a detenção de 03 (três) meses a (01) ano e multa.

Como dito, essas são apenas algumas questões levantadas com a recente situação de calamidade pública que o país enfrenta e que afetam diretamente a forma do empresário vislumbrar o serviço de assistência funerária ofertado aos clientes. Certamente no dia-a-dia outras mais questões surgirão, mas em relação aos planos de assistência funerária, essas são as mais comuns e relevantes à atividade.

Fonte: Dr. Anderson Adão – OAB 40.886/PR

Leave a comment

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *